Greve

O leitor assíduo – e digo-o no singular porque não acredito que seja mais do que um – terá, por certo, reparado na reconfortante inércia que este blogue tem apresentado nos últimos tempos. Aos olhos mais ingénuos poderá parecer que concedi umas férias ao leitor, para que pudesse poupar a sua pobre cabecinha aos recorrentes disparates que por aqui vão pululando. Nada disso! Venho por este meio informar que termina hoje um ciclo de 21 dias de greve!

Antes de mais, o leitor estar-se-á a questionar quanto ao significado dos 21 dias. “Porquê 21?”. Porque 20 dias seriam pouco e 22 já seriam um exagero… O motivo da greve tem uma explicação igualmente complexa e requintada: estou indignado!
Estou indignado, caro leitor, porque me sinto ignorado pela Crise. Aparentemente, ser blogger é fácil e não dá direito a remuneração. Há até quem lhe chame “passatempo”…invejas! Perante isto, a famigerada Crise ignora-me, olha-me de soslaio e não me retira regalias nem me provoca cortes salariais. Cortar num salário de 0 Euros seria deveras complexo, mas o que tenho visto nos últimos tempos dá-me o direito de sonhar.
Ora este comportamento rude da Crise incomoda-me porquanto me está a provocar transtornos do foro social. Veja bem que eu não tenho do que me queixar, caro leitor! Não é possível manter uma conversa de circunstância, nos dias de hoje, sem que a dita Crise venha à baila e, perante a minha situação particular, vejo-me remetido ao silêncio. Não concebo de forma alguma a ideia de um pensionista ser mais afectado pela Crise do que eu! O pensionista já teve o seu tempo e já desfrutou das crises de que tinha que desfrutar. Aliás, até deve ter abusado nas crises, a avaliar pela extravagante pensão que aufere. Há que dar, portanto, oportunidade aos mais jovens de serem explorados…
Espero, sinceramente, que este período de 21 dias de greve de imbecilidade tenha chamado a atenção dos nossos governantes. Vivemos numa sociedade democrática e não podem uns ser filhos e outros enteados. Devemos todos, então, ser de igual forma prejudicados: os que ganham pouco e os que não ganham nada. Já os que ganham muito podem estar descansados, pois esses não são filhos nem enteados. Esses são os pais da Crise…  

O Supermercado

Há quem diga que a economia portuguesa se está a afundar. Há quem diga que a economia portuguesa já se afundou. Contudo, ninguém tem certezas absolutas. Trata-se, portanto, de uma questão para escritores de ficção científica. Por simples acaso, a ficção científica até vem a propósito, já que me parece que apenas um herói poderá salvar os portugueses…

Por esta altura o leitor perguntará: “Que herói é esse? É um economista? É um gestor?”. Não, caro leitor, é o Supermercado! Como em quase todas as histórias de super-heróis, o Supermercado conta com o antagonismo de um super-vilão: o Super-Desemprego. O Supermercado faz, então, uso do seu super-poder – as Caixas – para defender os Licenciados portugueses do malévolo Super-Desemprego. Este cruel vilão é conhecido por atormentar e perseguir jovens recém-formados cuja última esperança de salvar as contas do mês é chamar pelo intrépido Supermercado…
Numa altura em que a sociedade parece estar num crescendo de frivolidade, é reconfortante saber que cada vez que pagamos as nossas compras somos atendidos por um indivíduo intelectualmente superior. Não raras vezes sinto o reflexo de agradecer o troco do meu pagamento com um simples “obrigado Dr.”. Na verdade, há que ter orgulho, pois poucos serão os países do mundo onde podemos fazer o avio do mês num local culturalmente tão elevado. França pode ter o Louvre. Espanha pode ter o Prado. Mas Portugal tem o Pingo Doce!
Apesar do seu poderio, o Supermercado não consegue manter os Licenciados perpetuamente a salvo. O leitor repare que este herói também tem a sua própria kryptonite: a Cupidez, artefacto que faz com que os seus empregados sejam super mal pagos. Perante esta fraqueza, outros inimigos – o Final do Mês e as infalíveis Contas – atacam o Licenciado sem dó nem piedade.
Brecht afirmou certa vez: "Miserável país aquele que não tem heróis. Miserável país aquele que precisa de heróis". Dito e posto isto, o leitor questionará: “Portugal alguma vez deixará de ser miserável?”. Essa, caro leitor, é mais uma questão para escritores de ficção científica…

Onde estão os Palhaços?

Caro leitor, venho por este meio comunicar-lhe que O Celibato e a Aldeia irá desfrutar de um revigorante período de férias com vigência a partir deste momento.
Caro leitor, venho por este meio comunicar-lhe que O Celibato e a Aldeia regressou do seu revigorante período de férias.

Não, caro leitor, não se trata de um erro. Este blogue apenas acabou de gozar umas férias “à Passos Coelho”. Aliás, se quisermos ser precisos e concisos, bastar-nos-á dizer que foram umas férias “à Coelho” para ilustrar a fugacidade das mesmas… Não ficam por aqui, contudo, as referências ao orelhudo animal, na medida em que o nosso Primeiro-Ministro nos ralha como se de láparos nos tratássemos, e compele-nos a saltar por cima dos nossos dias de descanso.
O exemplo mais recente desta intolerância surge trajado de Terça-Feira de Carnaval. O Governo levou à letra o aforismo “é Carnaval, ninguém leva a mal” e pregou uma partida aos portugueses, anunciando que não haveria tolerância de ponto no Entrudo quando faltavam somente 19 dias para as festividades. O povo não gostou e verbalizou o seu descontentamento: “palhaços!” e “ladrões!” foram as palavras de ordem. Não há, no entanto, razão para levar tais exclamações a peito já que, afinal, é Carnaval e ninguém leva a mal!
Com base num princípio de equidade, ficou, ainda assim, a garantia de que os elementos Parlamentares irão, também eles, trabalhar na próxima terça-feira. Lamentavelmente, parece-me evidente que esta medida surge apenas mascarada de “justa”, uma vez que o comum português não poderá aparecer no local de trabalho fantasiado de “preguiçoso”, mas os deputados e governantes deste país terão a oportunidade de entrar no Parlamento disfarçados de “trabalhadores”…
Amanhã as crianças sairão de casa na esperança de verem carros alegóricos a desfilar rua abaixo e, enquanto os pais pensam nas três cabeças de um “cabeçudo” chamado Troika, questionarão: “Onde estão os palhaços?”. Segundo a minha investigação, caro leitor, os “palhaços ricos” vão estar em São Bento e o que diz ser “palhaço pobre” vai estar em Belém…

Um Dia Especial...

Todos nós, caro leitor, temos um dia que nos é especial. Todos nós temos aquele dia que nos toca mais no coração e que nos faz sorrir com insensata sinceridade – vulgo “cara de parvo”. Para mim, esse dia é hoje…

Hoje é o dia em que penso que ainda ontem tudo começou e que ainda há tantos mais dias para percorrer. Deixo qualquer rasto de avareza para trás e esbanjo os meus fraquinhos rendimentos sem qualquer sentimento de culpa! É o dia ideal para passear, para fazer umas compras, para fazer um jantar especial, ver um filme, comer chocolates, enfim! Coisas que, por um motivo ou outro, nunca faria num dia normal…
Não raras vezes urge dentro de mim a ideia de que o dia de hoje é apenas uma imperiosa imposição do calendário e que o significado que lhe dou é injustificado. Talvez assim seja, mas este mirífico dia não é tão desprovido de história quanto o leitor mais despistado possa pensar, uma vez que, para algumas culturas ocidentais, o nome que lhe dá título tem raízes na Roma Antiga. Se não acredita em mim, caro leitor, faça o favor de pesquisar.
Muitas pessoas próximas – vulgo “amigos” – olham com olhos admirados para a felicidade com que vivo esta data. Compreendo a sua estranheza e digo-lhes, compreensivamente, que não desesperem, pois mais dia, menos dia, também eles terão a possibilidade de viver um dia assim. Não há motivos para invejar quem o pode viver em pleno, nem para fazer pouco de quem não pode fazê-lo…


Na verdade, pode dizer-se que se trata de um dia com diferentes significados para cada pessoa, mas eu nunca poderia ser arrogante ao ponto de ignorá-lo displicentemente. Creio que, por esta altura, não restaram quaisquer dúvidas ao leitor sobre que dia estou eu a falar. Não será preciso ser um génio para perceber que estou a falar da Terça-Feira – vulgo “o meu dia de folga”. Pensou que estava a falar de quê, caro leitor?

Nota: para lhe ser sincero, caro leitor, a Terça-Feira não é o meu dia de folga. Para lhe ser ainda mais sincero, eu nem sequer tenho dias de folga. Trata-se de uma mentira inofensiva com fins de humorismo.

(Montagem por Luís Lima)

Vitinho

Hoje, caro leitor, começo por relembrar uma personagem que surgiu em 1986 e que ainda hoje se detém no nosso imaginário. Ao leitor mais distraído relembro que o Vitinho era uma personagem animada exibida no canal um da RTP quando era hora de ir dormir. Ao leitor ainda mais distraído passo a fazer a descrição fiel e detalhada do dito boneco: era extremamente fofinho.
Pois os anos passaram e o Vitinho cresceu. Formou-se em economia, é professor universitário e, mais recentemente, tornou-se Ministro de Estado e das Finanças. Tem 51 anos – vamos ignorar a imprecisão científica – e prefere que o tratem por Vítor Gaspar.

Com certeza não terei sido o único a reparar que cada vez que o nosso Ministro das Finanças abre a boca para falar, os portugueses abrem a boca para bocejar. O outrora boneco animado transfigurou-se num boneco desanimado que faz aparições em jornais e telejornais a todas as horas do dia. A única constante é o soninho que induz: embala-nos com o seu discurso sempre acirrado e adormece-nos ao som das suas lengalengas.
Estranho, ainda assim, caro leitor, que a estratégia de “Vitinho” Gaspar para Portugal sair da crise seja adormecer os portugueses. Se a intenção era dormir, teria sido escusado o Governo roubar-nos quatro feriados nacionais. Dormir no local de trabalho parece mal e não é muito produtivo. Veja-se a produtividade da nossa Assembleia. Não estou a dizer que seja nula, é apenas exponencialmente baixa…
Como patriota e cidadão preocupado que sou, pretendo ajudar o nosso país a alcançar os seus objectivos de contenção de gastos. Com isso em mente, sugiro que se produza um medicamento genérico – bem baratinho, portanto – para ajudar qualquer português com insónias: um CD com o Hino Nacional interpretado pelo Ministro das Finanças! O fármaco em causa chamar-se-ia “Vítor Gaspar”, visto ser esse o princípio inactivo.
“Não seria melhor o ministro Vítor Gaspar ser um dos Patinhos?”, questionará, eventualmente, o leitor. De facto, seria. Os Patinhos são uma referência mais recente e se o ministro fosse um deles o país não se estaria a afundar porquanto, como sabemos, todos os patinhos sabem bem nadar…sabem bem nadar. No entanto, os patinhos somos nós, que caímos na conversa do Ministério das Finanças e que nos próximos anos vamos andar de cabeça para baixo e rabinho para o ar…    

Alarme Silencioso

Estava a ler um dicionário para descontrair, quando me deparei com a seguinte definição do vocábulo “silêncio”estado de uma pessoa que cessou ou se abstém de falar ou de produzir qualquer som.
Desta definição concluí que a sociedade de hoje em dia é irremediavelmente barulhenta. Ninguém se abstém e todos têm, a toda a hora, uma opinião a dar ou um ponto a contrapor. “Não me diga que tem alguma coisa contra opiniões?!”, indagará, ironicamente, o leitor. Essa é uma questão muito complexa, caro leitor… “Não é capaz de responder a uma pergunta com um simples ‘sim’ ou ‘não’?”. Não.

Ora, o âmago da problemática reside aí mesmo, no vazio de substância das ditas opiniões. Contudo, esta inanição não impede o imediatismo fúngico do surgimento das mesmas sob as mais distintas roupagens: um comentário no Facebook, um artigo num blogue – o género mais irritante, aliás –, ou um vídeo no Youtube. Chamo à atenção que todas as plataformas atrás enunciadas são louváveis e não costumam processar por difamação.
Alberto Caeiro dizia: "Procuro encostar as palavras às ideias". O problema é que, à falta de ideias, as palavras caem desamparadas. As pessoas têm mais pressa em dizer algo pretensioso do que em dizer algo sincero. A humanidade parece ter sido tomada por uma alergia ao optimismo e com ela desenvolveu a sensibilidade de um cacto. E, tal como a bizarra planta, esperamos inertes pela próxima oportunidade para espetar o nosso espinho.
A título de exemplo, realço as críticas ao mais recente anúncio da Coca-Cola, que, para além de promover o produto – claro está! –, transmite uma mensagem de esperança num mundo melhor. Muitos se apressaram a refutar essa mensagem, corrigindo os dados estatísticos apresentados pela marca com uma intenção que me parece ser, simplesmente, a de contrariar “porque sim”. Pois eu, caro leitor, qual miúdo de 5 anos, também fiz o trabalho de casa e com uma precisão científica arrebatadora afirmo: por cada optimista, existe meia dúzia de pessimistas.
O paradigma inverteu-se. Nos últimos anos, o silêncio tornou-se no mais ruidoso dos fenómenos e incomoda como o alarme daquele carro que dispara todas as noites. A sociedade já não sabe viver sem o constante rumor das opiniões e, na minha opinião, a solução para o problema passa por se calar quem não tenha nada de jeito para dizer. Tendo isso em conta, peço perdão e fico por aqui, caro leitor.    

Lata de Atum

Antes de encetar a habitual demanda pela parvoíce, queria deixar uma palavra a todos os que visitaram este blogue durante o ano de 2011. Ao leitor esporádico e ao leitor assíduo – sim mãe, estou a falar contigo – um “obrigado”.
Em jeito de retribuição, decidi que o primeiro post de 2012 deveria ser especialmente bom. Concluí, porém, que não seria racional da minha parte desrespeitar, sem mais nem menos, os baixos padrões de qualidade e os altos níveis de auto-comiseração a que o leitor já se habituou neste espaço. Racional seria, isso sim, consultar os astros antes de tomar decisões desta premência…

Como o caro leitor já deve ter reparado, eu sou uma espécie de poliedro: sou multifacetado. Dessa característica deriva um interesse pelos mais variados temas e, neste início de ano, não pude ficar alheio à febre das previsões astrológicas. Não me interessa o que os astros me reservam a mim – mero instrumento de escrita –, mas o que reservam a este blogue. Descobri, então, que, surpresa das surpresas, O Celibato e a Aldeia é Virgem…
“Virgem?!”, perguntará, pasmado, o leitor. Não seja infantil, caro leitor. Estamos a falar dos signos do Zodíaco. O Celibato e a Aldeia – OCA para os amigos – nasceu às 23h25 do dia 3 de Setembro de 2011 e é, portanto, do signo Virgem. Antes de conhecer as previsões para 2012, decidi instruir-me sobre a personalidade astrológica deste blogue. A pesquisa foi intensa e, no meio daquilo a que tecnicamente se chama “tretas”, aprendi que o OCA “é organizado, eficiente, extremamente analítico e crítico de uma forma objectiva, apesar de por vezes se envolver de tal modo em trivialidades que perde o significado por inteiro”. Confesso, caro leitor, que não entendo em que aspecto este blogue se perde em trivialidades. É um blogue útil e fiável como uma lata de atum – está lá para todas as ocasiões e acompanha muito bem com uma Salada Russa.
Onde é que íamos? Ah, previsões! Ora, segundo as minhas fontes, as ditas “previsões” são estranhamente parecidas a conselhos de um livro de auto-ajuda. Ainda assim, aqui fica a “previsão” que destaquei para o signo Virgem: “Leve-se extremamente a sério, pois se não for você a fazê-lo, quem o fará?”. Se ser como uma lata de atum não é levar-se a sério, não sei o que será! Pelo menos a lata de atum prevê a data de validade...
   

Carta a 2011

Caro 2011,

Antes de mais, deixa-me dizer-te que, juntos, passámos um ano fantástico! Mas, como todas as coisas boas da vida, a nossa relação tinha que chegar ao fim.
Quero que saibas que a culpa não é tua, caro 2011. Sou eu. Sou fraco e quando chega esta época começo a ceder às tentações: o champanhe, as passas, o fogo-de-artifício, esturrar dinheiro… Todas estas coisas indicam que vem aí um novo ano! Um ano mais jovem, repleto de novas experiências! Para além do mais, convenhamos que nos últimos tempos tens estado mais desleixado. Tornaste-te pessimista, só falas em dinheiro e até te deixaste engordar durante o Natal!
Se formos ver bem as coisas, nunca poderíamos ter dado certo. Os alicerces da nossa felicidade foram erguidos sobre os destroços de um coração partido. Pobre 2010… Abandonei-o sem dó nem piedade! Por isso te escrevo esta carta, caro 2011, para que saibas que não foste apenas mais um ano na minha vida. Foste 12 meses. Mais do que isso: foste 365 dias.
Vou ser sincero. Já existe outro ano na minha vida. Chama-se 2012 e é o ano mais jovem de que te falei. Ainda nem o conheci, mas viu-o no Calendário – esse tirano do Tempo – e não mais parei de pensar nele. É bissexto! Por isso, tem 366 dias, o que faz toda a diferença. Como vês, caro 2011, 2012 é um ano fascinante! Até os Maias tiveram uma paixoneta por ele, mas as coisas não resultaram. Contudo, comigo vai ser diferente e estou disposto a mudar para fazer com que as coisas corram bem entre mim e 2012…nem que seja por um ano.
Ainda assim, caro 2011, nunca esquecerei os momentos que partilhámos. Lembro-me, como se fosse hoje, do dia em que nos conhecemos. Aquela madrugada de 1 de Janeiro jamais me sairá da memória…apesar da ligeira amnésia alcoólica. A partir daí, avançámos para a frente sem nunca recuar para trás! Éramos, assim, loucos, tu e eu! Juntos, superámos as maiores adversidades e provocámos verdadeiras revoluções! Fomos capazes do melhor e do pior.

  
Com amor,

A Humanidade

Ode Natalícia

Já aqui foi dito, caro leitor, que não me considero poeta. Todavia, de quando em vez lá me surge aquela enfermidade a que chamam “inspiração” e, apesar de sentir que o paracetamol até remedeia a maleita, lá me rendo aos seus sintomas e escrevo aquilo que pode ser confundido com um poema. Quero que fique claro que não o é! É antes um “chorrilho de parvoíces que por acaso até rimam”, como ficou esclarecido por alturas do meu último ataque poético. Contudo, há que ter em conta que chamar o mesmo nome a duas coisas não é bonito e, portanto, aproveitando que é Natal, aqui fica o meu “chorrilho de parvoíces natalícias que por acaso até rimam”.


Ode Natalícia

Ó luzes mágicas que me guiam o caminho!
Que lugar me mostrais com a tua claridade?
Parece mágico, parece que cheira a azevinho…
Parece cheio de risos, alegria e felicidade!
Parece a terra onde nasceu o Natal,
Mas, afinal, é um Centro Comercial!

Adiante, nós vamos
Nos nossos trenós sem renas!
Somos o Pai Natal de nós mesmos,
Num pólo norte de lojas pequenas!

Os tempos são árduos e a crise bate à porta,
Mas na quadra natalícia nada disso importa!
Façamos, então, prendas com engenho inédito,
Ou, em vez disso, estoiremos o cartão de crédito!

De loja em loja saltitamos,
Quais duendes em frenesim!
Compramos tudo à última hora
Porque o “tuga” é mesmo assim…

Os presentes, o anseio das crianças,
Os pedidos, os sonhos e as esperanças…
Esperem! O São Nicolau enganou-se na rota!
Que desastre seria,
Se não tivéssemos a Popota!

Os contos de Natal e os momentos à lareira…
Raros postais do que já foi dessa maneira!
Melhor é na consoada olharmos fixos e ledos
Para as estrelas cadentes da Casa dos Segredos!

Estranhos modos tenho eu de falar
Desta quadra de paz e de cor…
Se reparar, estive só a empatar
Para, no final, poder desejar
“Feliz Natal” ao caro leitor!

Feliz Natal!

Apocalipse

Recentemente, este jovem blogue atingiu as 2000 visitas. “Só?!”. Sim, só. E a culpa é sua, caro leitor, que é extremamente desnaturado… Permita-me o leitor esclarecer que este número não é digno de referência pela sua grandeza, mas sim pela tremenda aflição que me causou! Repare que, quando constatei que estava prestes a virar o milénio das visitas, fui assombrado pelas memórias da passagem do ano de 1999 para 2000 e do temido “Bug do Milénio”.

Antes de prosseguir, relembro o leitor que a crença no dito bug se centrava na questão da viragem informática dos anos 1900’s para os anos 2000’s. Receava-se que os sistemas informáticos não assumissem correctamente o dobrar do milénio e regressassem ao ano de 1900. Uma viagem no tempo no mundo virtual que faria com que as nossas contas bancárias voltassem a zero, algo que causaria um certo aborrecimento no mundo real.
Mais elucidado, o leitor compreenderá, agora, o meu momento de pânico: imagine-se que o número de visitas deste blogue regressava às 1900? Pior, imagine-se que todos os artigos desapareciam, regressando este site à estaca zero?! Não consigo, sequer, imaginar o trauma que isso causaria no pobre leitor…
Pode respirar fundo, caro leitor. Se está a ler este artigo é porque tudo decorreu segundo a normalidade. Na verdade, o meu histerismo pueril – e desprovido de testosterona – não assentava em qualquer base científica. Porém, é precisamente esta a faísca primordial de todos os mitos e superstições: uma mistura de crença, medo e anseio de destruição. Ao nível subconsciente, todo o ser humano alimenta um secreto desejo de destruição. E não é pequeno esse desejo, dado que de tantos em tantos anos lá surge uma nova teoria sobre o fim do mundo – seja dos Maias ou do professor Bambo – e a pequena faísca transforma-se num incontrolável fogo que nuns se manifesta na forma de medo, noutros na forma de entusiasmo. E esse entusiasmo radica numa vontade evasiva de um mundo que, não raras vezes, pode parecer monótono e entediante. Espero, por isso, que perante a iminente destruição do meu blogue, o leitor tenha sentido um terrível e incontrolável medo!
Apocalipse – é este o termo que frequentemente ouvimos associado ao fim dos tempos. Mais informo que o presente post foi uma forma de apocalipse. Nada tema, caro leitor! Não se trata do fim deste espaço de pura imbecilidade. Etimologicamente, “apocalipse” significa “revelação”. Este artigo foi, só e apenas, mais uma revelação da minha eterna parvoíce…

O Grilo Vaidoso

Faz hoje uma semana que o Fado foi votado pela UNESCO Património Imaterial da Humanidade. Este motivo de orgulho nacional fez-me pensar no orgulho que cada português deve ter sentido quando soube da notícia; o orgulho de cada português fez-me pensar no orgulho pessoal de cada ser humano; o orgulho pessoal de cada ser humano fez-me pensar na vaidade, e a vaidade fez-me pensar no espelho.

Desengane-se, caro leitor. A introdução do post de hoje não se trata de um anúncio à popular loja de electrodomésticos. Trata-se, isso sim, do meu processo criativo. Há quem possa dizer que é um processo estúpido, e eu estou totalmente de acordo. Contudo, este método também é provido de um certo brilhantismo. Repare que fiz referência a um acontecimento recente e mediático, afastando eventuais críticas acerca da actualidade deste blogue. “E qual é a relação do espelho com esse acontecimento?”, contestará o leitor com impertinência. É uma relação de derivação, como ficou claramente demonstrado. “Já alguém lhe disse que tem a mania que é esperto?”. Já, caro leitor. E estavam todos redondamente enganados…
Falemos, então, desse estranho artefacto conformador de atitudes. O espelho atrai o ser humano até si e cativa-lhe o olhar. Se estamos perto de um, alteramos os nossos gestos e expressões e a imagem reflectida assume a pose do nosso alter-ego vaidoso. Se estamos longe de um, algo nos sussurra à consciência e nos impele a caminhar na direcção do nosso reflexo. É o Grilo Falante da vaidade. É o Grilo Vaidoso.
Pois se somos o Grilo Vaidoso, o espelho, nosso fiel companheiro, não está longe de ser o Pinóquio. O silêncio do espelho é indulgente e, sobretudo, mentiroso. Tivesse o adorado objecto capacidade verbosa e a resposta à pergunta "Espelho meu, espelho meu, haverá alguém mais belo do que eu?" seria, por certo, muito desagradavelzinha. Posto isto, e perante a minha escassez de mais alusões a filmes da Disney, parto para a conclusão.
Esclarecido que está o poder do espelho, alerto o leitor para que não se deixe enganar pelos murmúrios vaidosos da consciência. Para prevenir aborrecimentos, peço-lhe que memorize o seguinte aforismo: "A consciência é como um espelho…às vezes embacia".

Nota: o tema do presente artigo foi, de certa forma, sugerido pelo gentil comentário da leitora Ana S. –  http://ocelibatoeaaldeia.blogspot.com/2011/09/revivalismo.html?showComment=1318770869559#c7501385670060396088. Fica o agradecimento.

Feliz Inconsciência

Em 1984, a banda anglo-americana Foreigner editou o seu maior sucesso: “I Want to Know What Love Is”. O leitor não se deixe enganar pelo título lamechas da canção. Trata-se de um tema cruel e que viajou no tempo para maltratar uma pobre alminha…

Saltemos agora 25 anos no tempo. O calendário marcava o ano de 2009. O lugar era obscuro e eu sentia-me como que em movimento: estava no 16 da Carris. Sentado ao meu lado estava um jovem que, de phones nos ouvidos, se isolava do mundo ao seu redor. Infelizmente para o dito, o mundo ao seu redor não se isolou dele, e não pôde deixar de ouvi-lo cantar: “I want to know what love is…I want you to show me!”.
  Para além de saber a letra de fio a pavio – que deve ter decorado quando ainda era uma menina –, este homem de barba feita cantava com entusiasmo e afinação descontrolados! Nem o uníssono das gargalhadas o fez aperceber-se de que, afinal, não estava apenas a sussurrar a canção, mas a vocalizá-la a plenos pulmões. A escassos dois palmos de distância estava eu, a lutar contra o que parecia uma inevitável perfuração do tímpano esquerdo e a perguntar-me o porquê dos Foreigner terem lançado tal maldição sobre aquele pobre sujeito.
Decidi naquele momento que alguém tinha que fazer frente àquela canção dos demónios e salvar aquele rouxinol engasgado de um embaraço ainda maior. Deparei-me, porém, caro leitor, com um dilema moral: alertar o desgraçado para a triste figura que estava a fazer, ou deixá-lo cantar, chegar ao seu destino de paragem e ir para casa feliz e inconsciente de que acabara de fazer a viagem de autocarro mais ridícula da sua vida.   
Já a prever que um dia eu me veria em tal situação, Nietzsche perguntou e respondeu: "Que encontras de mais humano? Poupar a vergonha a alguém". Lamentavelmente, eu não penso nestas coisas. Aliás, gosto de pensar que o meu cérebro é o sítio para onde o silêncio vai descansar… Por isso, apesar de ter poupado a vergonha ao rapaz em 2009, decidi agora, do alto da minha humanidade, publicá-la neste lugar privado a que chamamos “internet”. Afinal de contas, caro leitor, errar é ainda mais humano.

O país dos Quatro F's

No ano de 1373, Portugal e Inglaterra assinaram a Aliança Luso-Britânica. Ainda assim, o casamento entre as duas nações nem sempre foi pacífico e, finalmente, creio ter descoberto o motivo de tantos arrufos: a pontualidade.

A pontualidade parece ser, tanto quanto a história consegue recordar, a imagem de marca do povo britânico. Do lado luso, a imagem de marca tem sido, desde a obscura época do Estado Novo, os Três F’s – fado, futebol e Fátima. Mas, como tudo aquilo que faz a viagem do passado para o futuro, esta expressão corre o risco de se tornar obsoleta e, por isso, aqui se procede à sua actualização: Portugal, o país dos Quatro F’s! “E qual é o quarto F?”, questionará o leitor. É a falta de pontualidade, claro está.
Portugal, infelizmente, sempre se pautou pelo atraso constante e até é de admirar como é que os governantes dos dois reinos se conseguiram encontrar na mesma sala, à mesma hora, para assinar o supracitado acordo. A falta de pontualidade é algo que está tão enraizado na cultura do povo português como o próprio folículo do tradicional bigode que, a dada altura, toda a gente usou…até os homens.
O português rege-se, portanto, por um fuso horário muito próprio e, felizmente, o nosso povo já aprendeu a lidar com este retardamento crónico: habituámo-nos a contar com o atraso uns dos outros. Contudo, embora este método possa parecer a solução para ninguém esperar por ninguém, a lógica deste raciocínio coloca-nos perante um problema a longo prazo: o atraso português é exponencial! Trata-se, sendo assim caro leitor, de um problema matemático…o que também não é o forte dos portugueses. A nossa fraca pontualidade é um triste hábito, diga-se, mas parece-me que já não vamos a tempo de corrigi-lo…
O leitor mais atento com certeza já terá reparado que o presente artigo está uma semana atrasado. Podia pedir desculpa ao leitor pelo meu incumprimento, mas não o farei! Aquilo a que muitos chamarão irresponsabilidade, eu chamo patriotismo!

Viva Portugal!

A melhor amiga da comédia

Há uns dias atrás estava à janela a ver o pôr-do-sol e a beleza do fenómeno natural a que assistia inspirou-me. Peguei na guitarra e comecei a tocar. Os raios do sol letárgico aqueciam-me a face e os suaves acordes sussurravam-me aos ouvidos. Construí, assim, um momento de rara perfeição, até que uma corda rebentou e me vazou um dedo.
Entre gritos, apitos e impropérios irrepetíveis percebi duas coisas: a primeira é que tinha um vergão no dedo; a segunda é que na vida sobrevalorizamos sempre as coisas más.

“Fez um dói-dói no dedinho, foi?”. Sinceramente, caro leitor, começo a ficar farto desses seus comentários jocosos. O leitor deve julgar que este blogue é uma infantilidade ou uma patetice! Engana-se redondamente! Na verdade, é uma mistura dos dois: é uma patetice infantil. O comentário proferido, ainda assim, só reforça a ideia introduzida no post de hoje: o leitor podia ter-se centrado no que de bom foi descrito até aqui; contudo, prevaleceu o instinto de gozar com o meu dói-dói.
“E porque será que sobrevalorizamos sempre as coisas más?”, perguntará o leitor, fingindo-se de interessado. Há quem diga que se deve à criatura humana ser inatamente pessimista. Eu digo que se deve à criatura humana ser inatamente trocista. História nenhuma vale a pena ser contada aos amigos se não envolver pormenores rocambolescos revestidos de desgraça, porque é com a nossa miséria que eles vão rebolar a rir. Não é por acaso que ao lado da máscara da tragédia está sempre a da comédia…
Aqueles breves minutos à janela, por exemplo, tinham tudo para ser uma pequena mas agradável recordação. No entanto, se o caro leitor me perguntar que música eu estava a tocar na guitarra, não lhe sei responder, por muito que puxe pela memória. A única coisa de que me recordo vividamente é de ter levado uma fisgada no dedo. A única coisa que conservo daquele bonito momento é um valente vergão no dedo. É mesmo assim, o nosso cérebro, selectivo e sedento de comiseração e protagonismo, atribui aos pequenos infortúnios o papel principal.
Em última análise, nunca nos podemos esquecer de que quando uma corda se parte basta substituí-la para continuar a tocar. Nunca nos podemos esquecer de que não interessa que música tocamos, mas simplesmente tocar. Também nunca nos podemos esquecer de que há um momento a partir do qual as metáforas se tornam ridículas. Tendo isso em conta, fico por aqui caro leitor.


Um artigo muito fraquinho...

Antes de mais, caro leitor, quero avisá-lo que o artigo de hoje é muito fraquinho! “Já se percebeu que é uma pessoa de hábitos…”, dirá o leitor, numa tentativa bem sucedida de me desmoralizar. É fraquinho porque me deu a preguiça e, por isso, decidi fazer uma simples lista. Estou, desta forma, a sustentar a minha preguiça e a do caro leitor, uma vez que fazer uma lista é bem mais fácil do que escrever um texto como deve ser, e lê-la é como ir às compras sem ter de ir, de facto, às compras. Sem mais delongas, – que é como quem diz que vou parar de encher chouriços – aqui fica a dita lista.


Lista de coisas que me fazem espécie

A preguiça – estranha enfermidade que só nos aflige quando temos alguma coisa para fazer. Dá origem a posts fraquinhos; faz com que os japoneses não se dêem ao trabalho de cozinhar a comida e faz com que a humanidade tenha decidido abreviar “at” para “@”. Escrever aquele “t” estava a roubar-nos anos de vida.

As touradas – o facto de serem um espectáculo desumano e medieval nem me incomoda muito. Os forcados vestirem napperons e toalhas de mesa é que me choca profundamente.

O gravador de arroz – falo daquele senhor que passa o Verão a gravar os nomes das pessoas num grão de arroz e que cobra 5 euros por isso. Peço ao leitor que pense que 1Kg de arroz custa 1 euro e que faça as contas à margem de lucro deste indivíduo…

Os ginásios – homens em camisolinhas de alças, a suar e a grunhir a poucos centímetros uns dos outros é algo excessivamente másculo para a minha pessoa.

Os autocarros da Carris – surpreende-me que na secção de enlatados dos supermercados não exista “Sardinha Carris”.

Escrever sobre o que nos irrita num blogue – usar um blogue como um diário pessoal é quase tão irónico e inapropriado como o “Diário de Anne Frank” ser um best seller

A incoerência – detesto pessoas incoerentes…

Antes que o caro leitor jure nunca mais visitar este blogue, deixe-me alertá-lo que a fraca elaboração deste artigo não passa de uma consciente e planeada estratégia de marketing. Repare que a expectativa elevada é a melhor amiga da desilusão! Eu apenas estou a zelar para que o leitor jamais se desiluda com este fraquíssimo blogue.

"Mãe, estou aqui!"

No final do séc. XIX, os irmãos Lumière promoveram um salto tecnológico que causou furor no universo dos actores desempregados: criaram a câmara de filmar. Com o passar dos anos, a filmagem tornou-se banal, mas a geringonça destes irmãos acabou por adquirir capacidades que tangem o sobrenatural…

Vítima da minha própria inocência, durante anos encarei a câmara de filmar como um simples aparelho de captura de imagens em movimento. Certo dia, ouvi alguém dizer: “a câmara acrescenta-me cinco quilos!”. Estranhei tal despropósito, visto não reconhecer quaisquer valores nutritivos à câmara. Contudo, este facto fez-me despertar. A câmara, afinal, é mágica.
“Largue a droga!”, avisará o leitor. Não seja tacanho, caro leitor. A câmara é, de facto, mágica. São inegáveis as suas misteriosas propriedades, capazes de perturbar os circuitos das máquinas e as células dos seres. Note-se que não só nutre, como consegue amplificar a rede dos telemóveis e reforçar os laços de afecto: para onde quer que aponte uma câmara, existe uma pequena multidão que aproveita para telefonar à mãezinha e descansar-lhe o coração com um simples “mãe, estou aqui!”. A objectiva também provoca surtos de adrenalina e palermice em geral: para onde quer que aponte uma câmara, existe um bravo pronto a saltar de uma varanda ou disposto a afocinhar numa valeta. Atenção, não estou a condenar ninguém, caro leitor. Repare que criticar é uma cena que, a mim, não me assiste.
Existe, portanto, um padrão: para onde quer que aponte uma câmara, as massas convergem. Surpreendentemente, isto pode solucionar os problemas do nosso país! Prepare o seu guarda-jóias, caro leitor, que vem aí uma pérola de sabedoria: apontem câmaras aos locais de trabalho, às escolas e às assembleias de voto! Estes locais tornar-se-ão simplesmente irresistíveis, e todos comparecerão. Todos excepto aqueles que estejam fechados dentro daquela casa que tem câmaras a apontar para todo o lado… Enfim, isso agora não interessa nada!
Para finalizar, gostaria de partilhar um estranho facto com o leitor. Enquanto escrevia este post engordei 15 quilos e senti-me especialmente estúpido! Tinha três câmaras a apontar direitinho a mim…terá sido isso? Se foi, há que proceder à correcção dos factos históricos. Irmãos Lumière: inventores da parvoíce.

Use Preservativo

Aviso: o artigo que se segue contém um eufemismo referente ao órgão sexual masculino. Pede-se ao leitor mais sensível que abandone esta página e volte a brincar com a Barbie.

Há pouco tempo estava no cinema e vi uma rapariguita, de doze ou treze anos talvez, a virar costas à tela e literalmente montar-se – passo o termo grosseiro – no colo de um incauto rapazito. Ele enterrou-se na cadeira, surpreso. Ela olhou-o nos olhos como quem está prestes a dizer algo tirado de um livro de poesia. De súbito, acercou-se ainda mais dele e disse-lhe ao ouvido, em jeito de segredo, mas em tom de anúncio, o que tinha guardado no coração: “o que é que queres fazer se nem pilinha tens para isso?!”. À falta de melhor reacção, pensei: “o Carlos Paião estava tão enganadinho…”.

Com o passar dos anos tenho reparado que quanto mais velho fico, maior é o número de pessoas mais novas do que eu… Este estranho facto tem-me levado a observar os jovens das novas gerações. Crescem a um ritmo alucinante e a sensação que se tem é de que chegam aos quinze anos de idade mesmo antes de completarem os dez…se é que me faço entender, caro leitor. Assim sendo, os romances juvenis, cândidos e platónicos, já não existem e quando no karaoke ouvimos “Cinderela” de Carlos Paião, ouvimos um dinossauro social: aquela espécie de inocência já desapareceu do planeta.
 O que pretendo dizer ao leitor é que as crianças e adolescentes de hoje em dia são produto de uma sociedade altamente modernizada e sem fronteiras. Naturalmente, isso traz muitos sarilhos e muitas escolhas difíceis aos pais. Quando os filhos perguntam de onde vêm os bebés, o que se deve responder? Impingir a conversa da cegonha ou deixar que descubram a verdade num qualquer site pornográfico, ou pior, num episódio de Morangos com Açúcar?! Livros ou videojogos? Dizem que os livros fazem mal à vista e diversos estudos – desconfio que feitos pela Sony e pela Nintendo – indicam que jogar até faz bem aos miúdos. Como castigá-los? Enfim, isso já dependerá dos casos. “Por exemplo, se apanhar o puto a ver um site de sadomasoquismo?”, instará o leitor. É certo que bater-lhe não servirá de nada…
Por esta altura o leitor estará a pensar: “Afinal, como competir com televisão, consolas e internet?”. A resposta é muito simples: use preservativo, caro leitor…use preservativo.
  

Einstein vs Endemol

O tempo passou a voar e desde que comecei a escrever neste espaço já se contaram cinco semanas! É como tudo na vida, caro leitor. Quando estamos a fazer algo de que gostamos muito o tempo corre apressado e, para lhe ser completamente sincero, estas cinco semanas pareceram-me apenas 35 dias. Estranha forma, a minha, de percepcionar o tempo… Mais estranha ainda, é a forma de percepcionar o tempo dos valorosos homens e mulheres que, por esse mundo fora, participam em Reality Shows.

No início do século XX, Albert Einstein debateu-se com hipóteses e evidências para tentar demonstrar, de forma teórica, que o tempo é relativo. A ideia geral é – e perdoe-me o leitor as óbvias imprecisões científicas – que o tempo passa mais devagar quanto mais rápido nos deslocarmos no Universo. Lamentavelmente, o físico germânico estava longe da verdade e, em 1999, um cientista de nova geração destronou Einstein. O seu nome: Endemol. A sua teoria: The Big Brother.
A Teoria do Big Brother tem uma premissa muito simples: selecciona-se um grupo de indivíduos de baixo QI e engaiola-se esta amostra experimental durante três meses numa grande casa vigiada por câmaras 24 horas sobre 24 horas. Passado pouco tempo os efeitos da experiência começam a sentir-se e a amostra – “os concorrentes” – começa a dar sinais de desorientação. O técnico de laboratório – “o apresentador” – interroga mordazmente os concorrentes até que um deles cede e profere a frase que empurra os escritos de Einstein para o fundo da gaveta da Física: “Cá dentro o tempo passa, tipo, mais devagar!”.
Está ainda por encontrar o factor por detrás desta evidente e inegável desaceleração do tempo. “Será a casa? Serão as câmaras?”. Não se sabe, caro leitor…não se sabe. No entanto, e tendo em conta que os concorrentes afirmam que “passados uns tempos já nem reparam nas câmaras”, suspeita-se que o principal factor seja o baixo QI dos ditos.
A Endemol conseguiu provar, na prática e em apenas três meses, o que a comunidade científica julgava estar longe de ser provado. Desta feita não falo da Teoria da Relatividade, mas de outra teoria que Einstein defendeu: "Duas coisas são infinitas: o Universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao Universo, ainda não adquiri a certeza absoluta”.

Ode Social

Hoje, caro leitor, estava a sentir-me inspirado…depois tomei um ben-u-ron e passou-me. Como já me estava a sentir melhor decidi escrever algo poético. Não sou, de forma nenhuma, poeta e por isso sinto um certo embaraço em chamar ao que fiz “poema”. Assim sendo, prefiro simplesmente chamar-lhe “chorrilho de parvoíces que por acaso até rimam”. Feito que está o devido reparo, aqui fica o meu chorrilho de parvoíces que por acaso até rimam.  


Ode Social

Triste, a solidão que me atormenta noite e dia.
Ó que estranha luz me liberta desta dor?
É o Explorer na sua infinda sabedoria,
A ligar o Facebook no meu monitor!
Um, dois, três, quatro breves cliques e já está!
Abre-se a janela sobre um mundo novo!
Comunguemos, caro amigo, caro leitor,
Deste modernizado Ópio do Povo
Que a bendita Internet nos dá!

Nome, ocupação, sexo e idade?
Perguntas de uma tal simplicidade
Que fazem da palavra “privacidade”
Expressão imprópria e vil!
Gostos, interesses, foto e estado civil,
É tudo quanto basta para criar um perfil.

Vou adicionar-te a ti, a ti e a tantos mais!
Não me renegues, pessoa que eu odeio,
Vamos ter conversas banais…
Não interessa se te falo quando te vejo!
Vamos ser amigos virtuais!

Partilhar as fotos das viagens que fiz.
Ó ditosa ferramenta que permites tal proeza!  
Mostrar a todos como sou feliz
E velar a minha tristeza,
Com comments, tags e afins!

Comento tudo o que há para ser comentado!
Nem preciso ser sincero. Basta-me ser gentil.
Escrevo em Português errado,
Mas sou campeão do FarmVille!

Se a actividade rareia no Mural,
Publico uma foto semi-nu!
E sou visto por um predador sexual
Porque temos um amigo em comum…

Ah, que alegria a popularidade!
Falar no chat, fazer pedidos de amizade!
Não! Não me farto e até aposto
Que a cada vídeo estúpido vou clicar “gosto”!

Revivalismo

"Devo ter uma enorme quantidade de inteligência; às vezes até levo uma semana a colocá-la em movimento."

E assim, nas palavras de Mark Twain, fica explicado o motivo pelo qual os meus posts são semanais. “Que falta de modéstia!”. Engana-se, caro leitor. A modéstia, por acaso, até é a minha maior qualidade. A modéstia e a genialidade. Mas chega de falar de mim. Vamos falar dos outros que isso é que está na moda.

Tenho reparado, ultimamente, que prolifera na televisão portuguesa um sem-número de espaços dedicados à nobre actividade de falar da vida dos outros. E, de preferência, falar mal. “Televisão cor-de-rosa!” sugerirá o leitor. É uma sugestão um bocado parva, mas de certa forma adequada ao caso. A “televisão cor-de-rosa” – vou fazer a vontade ao leitor – parece ter vindo para ficar e tem sequestrado os canais da nossa TV, um atrás do outro. A minha primeira reacção a este fenómeno foi de repúdio e completa desaprovação, contudo, após uma séria reflexão sobre este assunto premente, apercebi-me de que, afinal, não se trata de futilidade. Trata-se de revivalismo.
Sim, caro leitor, revivalismo. Os brilhantes senhores da televisão estão a resgatar a velha tradição portuguesa das coscuvilheiras debruçadas à janela. Naturalmente, as coscuvilheiras evoluíram, desceram das janelas e instalaram-se confortavelmente em estúdios de televisão. Os aventais e as chinelas foram substituídos por vestidos de alta-costura e saltos agulha. A discrição da conversa em surdina já não é bem-vinda e todo o Portugal deve ouvir em alto e bom som. “Coscuvilheiras” tornou-se um termo anacrónico, e por isso agora são “comentadores”. O objecto de coscuvilhice também evoluiu. Já não se fala dos vizinhos, fala-se dos “famosos” – notáveis seres cuja utilidade à sociedade se está para descobrir. O pinga-amor lá do bairro já não é o padeiro. É o Cristiano Ronaldo.
Curiosamente, muitos destes espaços de discussão têm uma frequência semanal. Pelos vistos, também os ditos comentadores precisam de uma semana para pôr a sua grande inteligência em movimento. “Está para aí a falar, mas nos seus artigos também fala mal das pessoas!”. Com certeza, caro leitor. Mas eu não faço disso profissão.  

Um termo relativo...

Caro leitor, o post de hoje é especial. Não apenas especial, o melhor da história da Web! E, por ser tão extraordinariamente bom, vai fazer o leitor sentir-se fofinho e aconchegado…
Com as palavras supraditas se introduz o tema de hoje: a mentira.”O senhor estava a mentir-nos?!” estará o leitor a gritar perante o pulsar do seu monitor. Primeiro: não me trate por senhor. Se reparar, eu não lhe chamo “senhor caro leitor”! Trato-o pelo seu nome próprio. Sugiro que faça o mesmo. Segundo: “mentir” é um termo relativo. Terceiro: sim, estava a mentir.
Menti-lhe, caro leitor, para provar um ponto de vista: a mentira nem sempre é má. Por breves momentos o leitor pensou que iria ler algo de extraordinário e sentiu-se feliz por isso. Podemos, então, dizer que a mentira gera bons sentimentos. A desilusão que se segue à descoberta da mentira é apenas e só culpa da incompetência do mentiroso. Por isso, peço desculpa ao leitor caso se esteja a sentir desiludido e sugiro-lhe que procure consolo no colo do Pai Natal.
Muitos desconhecem, mas a tradição da mentira foi iniciada por uma mulher há mais de dois mil anos atrás, mais precisamente nove meses a.C., quando Maria teve que explicar a José de Arimateia o motivo dos seus enjoos matinais. Todavia, a mentira evoluiu e acabou por se tornar a melhor amiga do homem e, apesar de não ter quatro patas e até ter perna curta, pode ser bem mais útil que qualquer caniche. Será caso para dizer: quem não tiver cão, caça com gato…desde que o gato saiba mentir. Para prevenir, e porque os gatos são bichos de poucas falas, aqui ficam alguns exemplos muito fraquinhos que podem ser úteis ao leitor numa próxima situação de aperto:

1º Exemplo fraquinho

Mãe: “Então filho, que tal de escola?”
Filho: “Não me apeteceu ir!”

Resultado: cinco dedos marcados na cara.
Solução: mentira.

2º Exemplo fraquinho

Amiga: “O meu namorado acabou comigo! ”
Amigo: “Ah! Porquê?”
Amiga: “Disse-me que sou feia de mais para sair à rua, achas normal?!”
Amigo: “Acho…”

Resultado: cinco dedos marcados na cara.
Solução: mentira.

3º Exemplo fraquinho  

Namorada: “Estas calças fazem-me gorda?”
Namorado: (silêncio)

Resultado: cinco dedos marcados na cara.
Solução: mentira.


Não caro leitor, nem pense nisso. “Evitar mulheres com mãos de cinco dedos” é impossível! Portanto, comporte-se como um homenzinho e minta. “Nosso Senhor me ajude!”, estará o leitor a exclamar, escandalizado com tantos comentários machistas e estereotipados. Peço desculpa, não posso ajudar mais do que isto. E já lhe disse, não me chame senhor.

(ilustração por Sofia Palma)

Como os passarinhos?

Verão - estação que se segue à Primavera e precede o Outono.

É esta a definição que o dicionário de Língua Portuguesa nos dá para a estação mais quente do ano. Fique o caro leitor a saber que esta definição é manifestamente insuficiente. No dicionário da Língua dos Portugueses, o Verão é sinónimo de “migração para as terras do sul”. “Como os passarinhos?” perguntará o leitor. Não seja infantil, caro leitor. Os passarinhos não são para aqui chamados.
“As terras do sul” – não queria dizer nomes, mas chamemos-lhes Algarve – atraem gentes de todo o Portugal. O respeitável cidadão português passa, então, a chamar-se turista. Deixa de usar sapatos e passa a usar havaianas. Deixa de comer sardinhas e passa a comer sardines. As praias enchem, o sol torna-se uma obsessão e o mar o habitat favorito. O pai de família joga raquete e a avozinha faz topless. Simplesmente vergonhoso! Um pai de família não devia jogar raquete…  


O processo de migração, no entanto, inicia-se com um ritual intelectual complexo e que carece, até hoje, de explicação científica. Durante a época balnear, diversas famílias portuguesas desafiam a Física, e enxertam um apartamento T3 dentro de um Fiat Uno. Apenas as preocupações não seguem viagem. A famigerada crise não tem espaço na bagageira, mas o periquito sim. “Afinal os passarinhos fazem parte da história!” dirá o leitor. Deixe-me que lhe diga, caro leitor, que tem uma fixação por passarinhos…devia ver isso.
E assim vão os portugueses, em busca de uma versão menos vestida de si próprios, atormentados pela ideia de, à chegada, ter de tirar o T3 do Fiat para metê-lo num T1. Nada que não seja superado com uma ida à praia, ou um saltinho ao centro comercial para rebentar com o subsídio de férias, perdoe-me o leitor a vulgaridade da expressão. “Irresponsabilidade? Veleidade?” Gostaria de discutir isso consigo, caro leitor, mas estou atrasado. Já devia estar na praia.

(ilustração por Ana Isabel)

Certificado...

O primeiro artigo de um blogue é, como quase tudo o que é primeiro na vida, marcante e especial, mas nem por isso muito bom... Dito isto, o leitor estará a pensar: "por que raio vou ler um artigo que não é muito bom?". Não leia o primeiro caro leitor, leia os próximos. Esses vão ser muito bons…

Contudo, não posso parar de escrever por aqui. Há que legitimar este artigo como primeiro, para que os segundos possam ser segundos. O leitor veja, então, o texto diante de si como o certificado de qualidade dos próximos. 
Confesso − as confissões são uma boa forma de cativar o leitor − que tive alguma dificuldade em decidir sobre que tema iria discorrer neste primeiro post. Que temas me interessam? Que temas interessam ao leitor? Não descobri e, por isso mesmo, concluí que o melhor seria partilhar estas e outras dúvidas. Dizem os entendidos que partilhar é bonito e aproxima quem escreve e quem lê. Faça o leitor o favor de me avisar se estiver próximo de mais. 
Continuando na senda da dúvida e da partilha, aqui vai: o que torna, afinal, um blogue interessante? O que o distingue da circunstancial conversa de café? O que o distingue do colorido e melodramático diário adolescente? Que temas seduzem o eventual noctívago que passeie nas ruas da senhora internet? Que temas fazem de um blogue um blogue e não uma infindável e pesada corrente de perguntas retóricas…?  

 
Por esta altura o leitor estará a pensar: “por que raio alguém cria um blogue se não tem nada de jeito para dizer?”. Permita-me que lhe diga, caro leitor, que essa atitude não me está a ajudar… Não deseje um bom artigo logo no primeiro post. A verdade é que a satisfação é a morte do desejo e não seria de forma alguma correcto da minha parte matar o desejo do caro leitor logo no primeiro post. Não se trata de falta de criatividade, trata-se de boa educação…

(ilustração por Sofia Palma)